O dia em que a Premier League foi decidida

Vista de cima do gol de Arteta, do Arsenal, contra o Manchester City. Em meio a um hexágono de azuis, o jogador do Arsenal comemora.

Meu primeiro texto aqui no blog mencionava uma passagem de cetro no futebol inglês que parecia inevitável: o Manchester City era líder da Premier League com folgas e, talvez até mais do que isso, tinha dado um passo simbólico muito significativo ao humilhar seu grande rival regional, o Manchester United, com uma goleada constrangedora, ainda mais por ser na própria casa do grande clube inglês dos últimos vinte anos. O texto era sobre um jogo de liga em que o United eliminou o City e, presumia-se então, ao fazê-lo, teria atrasado um pouco a troca de mãos que empunhariam o cetro de Rei do futebol inglês. Mas uma sequência surpreendente de resultados adversos foi fazendo com que o City despencasse aos poucos de sua posição na tabela, visse o United tirar ponto a ponto a diferençaque os separava e, quando menos esperávamos, os red devils não só ultrapassaram seus rivais de cidade como estabeleceram uma sonora diferença de pontos que não podia mais ser resolvida apenas pelos confrontos diretos. Mas, ei, eram apenas cinco pontos, e uma vitória em confronto direto, aliada a um tropeço simples e concebível, um mero empate do líder, fariam com que o City voltasse ao mesmo número de pontos, tornando novamente acirrada e combativa a luta pelo primeiro posto naquele que é o principal campeonato nacional do mundo. Só que o Manchester City tinha o Arsenal pelo caminho. E precisava jogar como postulante ao título para superar a boa fase do time londrino. Não aconteceu.

As estatísticas são impiedosas para os azuis de Manchester: seis finalizações ao total, sendo que nenhuma finalização correta. Ou seja, forçando um pouco a barra, se Szczesny fosse uma projeção holográfica, o City não teria descoberto isso no tempo real (forçando mesmo: ao fim do jogo, Szczesny evitou um contra-ataque perigoso espanando a bola na intermediária, num misto de excelente posicionamento e muita velocidade). Mas as estatísticas não contam toda a história. Não contam, por exemplo, que o melhor zagueiro do Manchester City no primeiro tempo foi Vermaelen, defensor gunner que sem querer impediu um arremate certeiro de seu colega Van Persie de alcançar as redes. Desde cedo na partida o gol do Arsenal vinha se cristalizando, com uma franca superioridade do clube londrino na posse de bola (65% contra 35%) e um jogo conduzido sem pressa, mas com objetividade (ou seja, era mais Barcelona que Real Madrid). Em outro belo momento, um excelente cruzamento diagonal de Song encontrou Van Persie em condições de passar por Joe Hart e finalizar, mas alguns centímetros deixavam o atacante holandês fora de jogo. Vale lembrar que DURANTE TODO ESSE TEMPO o empate já era inteiramente desfavorável para o Manchester City, que via seu contendor pelo título vencer o Queens Park Rangers por 2 a 0 (com direito a pataquada da arbitragem a favor do United, dando pênalti e expulsando o autor da suposta infração, fazendo o QPR ficar com dez em campo pelos 74min regulamentares restantes).

O Gol do Arsenal veio num momento em que nem era mais tão esperado. O jogo tinha se assentado, e apesar do empate não ser exatamente confortável para nenhum dos dois times, o Manchester City parecia absolutamente apático e o Arsenal, ainda que pressionasse, não chegava a ter chances claras de gol como a do gol “rebatido” por Vermaelen no primeiro tempo. Touré, machucado, tinha dado lugar a Pizarro, e como os grandes motivadores de outrora não estavam em campo (David Silva, Micah Richards), o City esperava que algo milagrosamente viesse dos pés de Milner, Nasri ou Aguero (e posteriormente de Tevez, que entrou aos 39 do segundo tempo). Não veio. Acabou vindo de Arteta, do outro lado. Esse jogador tático — limitado porém eficiente — que esquenta a posição de Jack Wilshere acertou um tiro muito forte de uns três metros antes da grande área e aos 42 do segundo tempo deu ao Arsenal a vitória que deixa os gunners com uma ligeira vantagem na luta pelo terceiro lugar da Premier League (o último lugar que dá acesso direto à Champions League, ou seja, sem passar pelo mata-mata preliminar, o equivalente do que chamam por aqui de pré-Libertadores). O gol não surgiu como um instante fortuito. Sua aparência foi simplesmente a de uma última machadada antes da árvore finalmente cair: vários golpes já haviam sido dados, a queda já era esperada, só faltava o toque de misericórdia. Em uma questão de dez rodadas, o potencial bicho papão da Premier League, os novos portavozes do novorriquissmo no futebol tomaram o golpe que faltava em suas pretensões imediatas de títulos significativos. Depis de uma eliminação inesperada na fase de grupos da Champions League, dos insucessos nas duas ligas nacionais e, agora, da distância de oito pontos que parece “intirável” diante das poucas rodadas e dos relativamente inofensivos adversários do Manchester United, não resta fazer muita coisa a não ser rezar. Não aos deuses do futebol, porque esses aí parecem estar se divertindo com essa irônica história de ascensão e queda dentro de uma mesma competição.

Quer dizer, resta sim outra coisa a fazer. Resta pensar por que o time decidiu contratar dois atacantes temperamentais e imaturos, flertando perigosamente com a burrice e a insanidade, como é o caso de Tevez e Balotelli. Tevez foi protagonista de uma novela terrível para sua reputação e para seu futebol, tirando-o de campo por quase uma temporada inteira. Menos culpa do City nessa aí: por mais sobressaltos que o argentino já tivesse dado, a birrinha e a falta de profissionalismo de Tevez não tinham, ao menos que eu saiba, sido elementos de sua rotina pregressa. Não como elementos crônicos. O mesmo já não pode ser dito de Balotelli, que quando na Internazionale de Milão era visto cantando alegremente, enchendo os pulmões, o hino do Milan. Além do excesso de grandeza de arrogar-se um dos maiores do mundo sem ter sequer dado uma prova em termos de títulos ou mesmo de titularidade permanente, Balotelli tem frequentes lampejos de estupidez, entrando acintosamente em divididas — no jogo de domingo solou a canela de Song e teria sido justamente mandado para o chuveiro no primeiro tempo caso o juiz tivesse visto o lance com clareza — e colecionando amarelos e vermelhos por decisões e atitudes aquém da bola jogada (agressões, reclamações etc.). É óbvio que nada disso explica por que David Silva vem sumindo em campo, por que Milner e Adam Johnson não têm mais chance na posição de Nasri ou por que Savic foi escalado como zagueiro mesmo com consecutivas falhas absurdas. Mas aí é bom perguntar para Roberto Mancini e para o honorável sultão Mansour bin Zayed al Nahyan. Tem coisas, afinal, que um mero colunista não tem subsídios para responder.

Previsibilidades

APOEL Nicosia nas quartas-de-final da Champions League, e depois oferecendo resistência no primeiro tempo ao poderio do Real Madrid: quem poderia prever?

Uma grande parte das atividades de escrever e comentar sobre futebol consiste em prever e, não acontecendo o previsto, justificar a legitimidade da previsão. Como em tudo na vida, há modalidades de intensidade e confiança, os mais temperados sabendo que existe uma margem de imprevisibilidade no porvir e os mais animados, frequentemente fanfarrões em busca de uma cravada certa para ascender em popularidade, que saem prevendo barbadas ou obviedades e, diante dos flagrantes equívocos cometidos com a regularidade de um relógio, voltam à cena com a mesma efígie de grande articulista (isso serve aos comentaristas de todas as espécies, dos especialistas em economia aos correspondentes internacionais cuja ideologia misteriosamente coincide com aquela exposta nas entrelinhas dos boletins das agências internacionais). No caso da arte, que é de onde venho, a tarefa básica consiste em descrever, avaliar e contextualizar o que já existe, obras, percursos individuais ou coletivos, ênfases de época, geografia ou modismo. As previsões apenas aparecem na parte de circo, quase sempre desinteressante e ridícula, das premiações: quem vai ganhar o Oscar ou quem, dado o Presidente do Júri de tal ou tal festival, tem mais chances de levar uma Palma ou um Leão — e mesmo assim, num contexto de festival internacional, a cobertura do “quem vai ganhar” é nada menos que banal (e ademais imprevisível, uma vez que há júris que ignoram a aclamação do público, há aqueles que decidem fazer escolhas para mandar “mensagens” ao mundo etc.).

Falar de esporte, ao menos sobre futebol, e ao menos no Brasil, é inevitavelmente dedicar uma boa parte da gastação de saliva para prever: tal time com esse técnico não vai adiante, tal jogador caindo pela meia-esquerda não vai conseguir nada, tal artilheiro indo para a Europa será o maior jogador do mundo. É claro que há explicações: pouco importa se O Pagador de Promessas ganhou Cannes em cima de Cléo de 5 às 7, O Anjo Exterminador, Os Inocentes, O Processo de Joana D’Arc, O Eclipse, A Deusa e Tempestade Sobre Washington, esses listados são hoje marcos do cinema e o filme de Anselmo Duarte uma curiosidade bem-cuidada. Mas pouco importa se um clube foi brilhante num campeonato — digamos, a Alemanha na Copa de 2010. Se não ganhou, babau, todo mundo relegará ao esquecimento ou ao título de exemplo a não ser seguido, como o Brasil de 1982: jogou bem, encantou o mundo, mas… O que é um bocado injusto: uma enorme parte do prazer de assistir a jogos de futebol é ver excelentes jogadas, atacantes talentosos, meias articulados, laterais velozes, ou seja, talento. Talento nem sempre é convertido em objetividade, ainda mais no futebol, em que resultados inesperados acontecem com maior frequência. Ainda assim, por alguma lógica misteriosa, ao fim de um campeonato ou temporada, todos os bons momentos que passamos durante o processo são passados no funil e convertidos em mera ilusão diante de um resultado negativo, como se uma série de vitórias no meio de uma temporada fosse absolutamente fictícia a não ser que o clube conquistasse o título no fim das contas. Daí parte da importância dada às previsões: privilegia-se mais o resultado final do que os caminhos que levam a seu acontecimento. É como se o filme valesse tanto quanto seu fim — e do mesmo jeito há gente que só vê filmes para ver como termina.

É óbvio que não se pode falar de futebol sem mencionar resultados — como acontece em arte, por exemplo. Mas prever, ainda assim, é sempre um tanto tolo. Divertido, claro, mas tolo. Primeiro, porque essa previsão ou é visionária, e portanto absolutamente subjetiva, ou então baseada numa interpretação tão correta quanto possível do passado recente de um estado de fatos e sua projeção mecânica sobre o futuro. O acaso faz o que tem que fazer, que é zombar dessas previsões trazendo sempre algo de imponderável ao recheio, algo de imponderável que é, contudo, a maior obviedade de todas: não é garantido que jogador X permanecerá comendo a bola, não é garantido que técnico Y continuará mantendo o time com a mesma obstinação, não é garantido que o time Z manterá a mesma energia até o final. Isso não quer dizer que todos que preveem se igualam (e não quer dizer que os não preveem sabem mais: no fundo são talvez mais tolos ainda ao não entrar no jogo): há aqueles que vão com tudo nos imediatos dados flagrantes e aqueles que usam de suas habilidades para equilibrar a avaliação com outros dados interpretativos, como saber ver um jogo, entender o processo de um time e simplesmente não se deixar levar por duas ou três ocorrências chamativas.

O passado recente foi muito cruel com aqueles que entraram no bonde imediatista — e muito divertido para aqueles que ficaram observando, moderados, enquanto os apressadinhos tinham que ter opiniões incisivas. O grande caso em questão é o Arsenal, que entre uma ida e uma volta de Champions League deixou de ser uma porcaria e tornou-se time sensação, e de grande besta Arsène Wenger virou o estrategista que dá tempo ao tempo até que sua equipe consiga obter resultados favoráveis. Antes era só Van Persie que minimizava a tragédia. Agora até Vermaelen e Koscielny, instáveis em posicionamento e desempenho ao longo da temporada, já voltam a ser elogiados por conta da impressionante série que o Arsenal vem tendo na Premier League desde que apanhou do Milan na Itália. Arteta já dá solidez ao meio-campo e Rosicky já é titular legítimo, apesar de jamais antes do último mês ter dado em campo justificativa de sequer ter sido contratado pelo time de Londres.É o poderoso predomínio do presente sobre o passado: esquece-se tão rapidamente da temporada anterior, do mês anterior, que toda a história de um jogador só vale o que ele apresentou em suas três últimas aparições.

Nos campeonatos nacionais dá-se coisa semelhante. Os três melhores campeonatos do mundo pareciam muito mais resolvidos há coisa de um mês do que agora. Na Alemanha, o Borussia Dortmund permanece com sólidas apresentações, mas bastou um jogo desencontrado e, paralelamente, uma série de goleadas acachapantes do Bayern de Munique para fazer cambalear os senhores da predição em prol de alturas mais aproximadas na balança. A verdade é que o Borussia permanece tão estável quanto sempre esteve: é, aliás, possivelmente o time mais estável do mundo, só que isso pode tão ruim quanto bom para o líder do campeonato alemão. Na Inglaterra, uma série de tropeços do Manchester City já começou a travar as línguas que antes já tinham o time como franco favorito para vencer a Premier League. E o Manchester United, que simplesmente continuou mantendo sua fase, sem nenhuma guinada flagrante para cima em termos de ritmo de jogo ou de oscilações de performance individual ou escalação, já passou a ser avaliado como se fosse muito melhor do que era no final do ano passado, em que pesavam as desclassificações na fase de grupos da Champions League e nas copas inglesas. Mas é no campeonato espanhol que as coisas adquirem real intensidade humorística, quando dois tropeços até então inimagináveis por parte do Real Madrid colocaram a distância entre Real e Barcelona em níveis aceitáveis (seis pontos) e, consequentemente, foi revogado o título antecipado que tantos já haviam concedido ao time merengue. Qual o pecado aí? O de sempre, projetar o passado no futuro e presumir que um time que não perdeu ponto contra times que não o Barcelona continuaria sem perdê-los mais à frente.

Poderíamos aplicar o mesmo tipo de raciocínio ao jogo que acaba de acabar entre Real Madrid e APOEL Nicosia. O time do Chipre montou uma defesa que guardou excelentemente sua meta por 74 minutos, e que em seguida se desmontou uma vez frustrado o objetivo de não tomar gols. Ora, as previsões ao final do primeiro tempo? Jogo duro, furar a defesa, 1 a 0 é goleada. Jogo terminado? Passeio do Real Madrid no Chipre, vitória convincente, classificação assegurada. Pode até ser verdade, mas como traduz-se a tensão em que o jogo esteve embalado até quase a metade do segundo tempo? Ignorada porque o resultado final sobredetermina o processo?

As saídas disso, infelizmente, não podemos prever. Assistir e comentar futebol são muito associados a distração descompromissada, onde não devem entrar os infortúnios do mundo (brigas de torcidas que matam gente e mobilizam a cidade, por exemplo) nem raciocínios analíticos. E, portanto, as previsões são vistas como purpurina, com as purpurinas de ontem varridas para baixo do tapete enquanto as de hoje são jogadas com a desfaçatez e a arrogância de sempre. Alguns diriam que é tudo diversão. Pode ser: mas há palavras cruzadas para adultos e outras para crianças de menos de 10 anos.

Levanta, sacode a poeira…

Como as pessoas, os times de futebol acordam em dia ruim. Como elas, entram em depressão também. E eventualmente saem dela. E quando um grande time recobra o entusiasmo, que prazer em observar todas as peças reencontrando seu lugar, o dinamismo retornar, a força, a objetividade, a leveza do futebol bem jogado. Como o Arsenal, que renasceu das cinzas depois de tomar uma piaba de 4 a 0 do Milan e ficar sem reação durante o jogo inteiro — e agora já conseguiu a proeza de virar o jogo e de vencer três grandes times ingleses em sequência –, agora foi a vez do Bayern de Munique, uma equipe com inegáveis talentos que em 2012 ainda não tinha encontrado seu melhor futebol e, a despeito até de performances individuais satisfatórias (exceto por Mario Gomez, que estava em seca de gols, não dá para dizer que alguém do Bayern estivesse jogando mal), o time não conseguia funcionar coletivamente, cada jogador desempenhando apenas o papel que lhe parecia designado mas sem a mínima fluência de equipe. Se o toque de alvorada do Arsenal foi a humilhação contra o Milan, o despertador do Bayern foi a rodada do dia 3 de março, em que o Borussia Dortmund colocou sete pontos de diferença na disputa pelo título da Bundesliga, vencendo soberanamente o Mainz 05 (ainda que tenha tomado um susto no meio do segundo tempo, rapidamente contornado) enquanto o Bayern perdia em Leverkusen para os donos da casa por por 2 a 0, apesar de uma clara superioridade incapaz de ser convertida em gols.

Era exigida uma mudança de postura. Não só por causa da Bundesliga, mas também porque nos jogos de ida o time alemão perdera do Basel, na Suíça, pela contagem mínima. O resultado não era nenhum desastre, porque na Allianz Arena o time da casa costuma se garantir muito bem, mas ainda assim a hipótese de cair nas oitavas da Champions League para um time sem expressão internacional seria motivo de crise, ainda mais acompanhado pelo distanciamento da luta pela primeira posição e por um flagrante desempenho aquém do que o escrete pode render. O resultado, acachapante, veio em dois jogos em que o Bayern realizou a proeza de marcar 14 gols e tomar apenas um. E esse gol sofrido tendo chegado num momento em que já nem mais havia jogo propriamente dito. Nesse contagem, Mario Gomez reencontrou seu caminho para o gol marcando sete (!) tentos, Robben humildemente colaborou com quatro ao passo que Müller, Kroos e Ribéry também deram suas colaborações mais modestas. Mas o que aconteceu para o time mudar da água para o vinho?

Bom, primeiro de tudo é uma questão de disposição. Na movimentação, na ocupação de espaços, na troca de passes, via-se nitidamente uma maior empolgação na forma de se postar em campo e de se apresentar para o jogo. Mas o inegável toque fundamental foi retirar Philipp Lahm da lateral-esquerda e colocá-lo na direita, remanejando o meia-esquerdo/volante Alaba, o Jumar deles, como lateral-esquerdo. Não é que a mudança tenha sido genial ou os jogadores envolvidos superiores do que a escalação anterior (o digitador destas linhas não acha Rafinha pior que Alaba, em outras palavras). É simplesmente que o Bayern de Munique precisava de algum truque, um placebo mesmo, que desse um frescor ao jogo da equipe. O resultado é que não só a direita de ataque do Bayern de Munique ficou selvagemente perigosa, tendo em Robben e Lahm dois grandes jogadores, como a movimentação mais fluida da equipe — com Kroos mais preso quando subiam os laterais — rendeu bons momentos de apoio de Alaba em que trocas de passe entre ele e Ribéry foram muito bem desenhadas. O time ainda tem algumas deficiências — poucas opções de banco, certa previsibilidade de movimentos que pode voltar a dar as caras –, mas se permanecer com o mesmo espírito com que destruiu o Hoffenheim e demoliu o Basel (Basel que, é bom lembrar, eliminou o Manchester United da Champions vencendo em casa e empatando em Old Trafford), é um time apto a postular o pódio mundial, mesmo que seja o bronze. E vale lembrar que Schweinsteiger, recuperando-se de mais uma contusão, entrou apenas no final desses dois jogos. Difícil será decidir quem sairá: Kroos ou Müller (já que Robben e Ribéry são absolutamente “intiráveis” atualmente)?

Com que por mágica, os deuses do futebol ajudaram o Bayern de Munique e o Borussia Dortmund finalmente perdeu seus primeiros pontos em 2012 pela Bundesliga, num empate bastante sem graça contra o Augsburg, mandante e 15º colocado do campeonato. A placidez outrora vista no Bayern diversas vezes esse ano estava agora no time de Dortmund, e o empate sem gols acabou recolocando o Bayern na briga pelo título, porque são agora apenas cinco pontos de diferença, três dos quais podem ser tirados no dia 11 de abril, quando Dortmund receberá o time de Munique.

Falando em emoção na disputa por título, seria impossível terminar essa coluna sem mencionar a absolutamente inesperada — ao menos NESSA rodada — troca de líder na Premier League. O Manchester City parece ainda não ter se recuperado da má fase que acometeu a equipe quando os irmãos Touré foram para a Copa Africana de Nações, e nesse ano já foram três derrotas para times fora do “G7” britânico (verdade que os três estão entre 8º e 11º). Em todo caso, a evidência está tanto na contagem final quanto na forma de jogar, porque o City parece ter perdido aquilo que tornava a equipe excepcional (no sentido de “de exceção”, não de “genial”, porque isso o City nunca foi, a não ser quando sapecou o United em Old Trafford por 6 a 1). O Manchester United, ao contrário, está finalmente podendo contar com opções de alto nível no meio-campo sem ter que sacrificar Giggs ou depender de opções pelas pontas — caso de Nani ou Valencia quando escalados como meias. Os casos em questão são Ashley Young, que na reta final do campeonato, e voltando de contusão, está jogando seu melhor futebol, e os três atacantes com excelente movimentação — Rooney recuado para quarto homem de meio de campo, Welbeck e Chicharito revezando entre ponta e centro no ataque — que Alex Ferguson escalou no fim de semana contra o West Bromwich. Mesmo que se duvide que Ferguson escale o time de forma tão ofensiva nos jogos mais perigosos, resta a pergunta: que jogos perigosos? Na Premier League, só há um jogo contra um time do “G7” da Premier League, e é a possível decisão de título de 30 de abril, pela antepenúltima rodada, entre os dois times de Manchester (ao passo que o City ainda pega o Chelsea e o Arsenal, entre os times que disputam vagas para torneios internacionais). Já o Arsenal, cada vez mais letal, se encaminha para ser a terceira potência da Grã-Bretanha, com Rosicky vivendo boa fase, as voltas de contusão de Sagna, Gibbs, André Santos e Arteta e, claro, o maior fator, a monstruosa fase de Robin Van Persie, o maior centroavante da temporada 2011-2012. Arsène Wenger rirá no final, quem diria…

Kairos, ou timing, ou o momento oportuno

Sem precisar mergulhar na filosofia, dá pra discutir um pouquinho sobre as questões do tempo no futebol sem soar metido a besta. Porque o futebol pede. Existe, para além do tempo cronometrado de 45 minutos e dos acréscimos regulamentares, boa parte de uma outra dimensão de tempo que escapa da cronologia, dos segundos, do tempo mensurável e domesticável do relógio. Cronos é a palavra grega para definir esse tempo “gráfico”, dos dias e das noites, da passagem contada do tempo, do tempo na dimensão dos afazeres humanos e das projeções. Mas ao tempo contido e definível, os gregos propunham duas outras palavras para caracterizar aspectos mais selvagens do tempo, digamos, o tempo que ultrapassa a experiência humana e o tempo intensivo, aquele que dá a impressão de passar turbilhões num segundo, aquele átimo que não equivale a qualquer outro átimo que venha a seguir ou antes, mas que é o momento decisivo em que algo se abre e se fecha rapidamente, como um vórtice de ficção científica, mas dentro da vivência habitual. O tempo aquém da experiência humana, o tempo da eternidade, é o aion, mas para o futebol ele não importa tanto. Agora, o kairos, esse termo que dá conta do momento de tempo intensivo, ele é fundamental para o esporte em geral, e para o futebol em particular: ele se resolve na superação, nas disposições súbitas, num tipo de compreensão que não é exatamente racional, mas de sintonia com um ritmo subterrâneo, como se o andamento de todas coisas tivesse marés invisíveis porém captáveis em situações decisivas. São esses os momentos que fazem a glória, porque eles não podem acontecer a qualquer dia e a qualquer hora, e precisam de alguém para agir no exato trecho de tempo em que uma ação se faz necessária. E não é só nas situações de conquista ou de eliminação iminente que elas aparecem, embora esse tipo de situação seja obviamente catalisador de situações de tempo intensivo.

Aproveitar um momento para dar a volta por cima não é necessariamente individual. Há timings coletivos, em que um grupo inteiro parece se levantar e tomar as rédeas de uma situação. Quando a mudança de disposição é brutal e o fundo do fosso acaba virando um trampolim, aos olhos do torcedor essa dobra temporal parece assumir uma aura de mágica, de surpresa extraterrena. Foi o que aconteceu na majestosa vitória do Arsenal contra o Tottenham nesse domingo. O time perdia de 2 a 0 no primeiro tempo e, apesar de não estar jogando terrivelmente mal, parecia um tanto apático e letárgico. Somava-se a essa impressão o fato de que o time de Arsène Wenger foi incapaz de qualquer reação à sapatada que tomara do Milan pelas oitavas-de-final da Champions League, naquele que era o jogo mais importante do time na temporada até então. E quando o primeiro tempo ameaçava acabar modorrento e sem horizontes para os vermelhos londrinos, eis que o time vira um fulminante rolo compressor e, guiado por Van Persie novamente em estado de graça, reverte nos cinco minutos finais a desvantagem colocando o placar em 2 a 2. O que se viu na volta do segundo tempo foi algo indescritível, com atuações de gala vindo até de jogadores de quem não se podia esperar nada, como Rosicky. Toques de bola precisos e objetivos, tabelinhas vistosas e sobretudo um gás vindo de sabe-se lá onde fizeram o Arsenal voltar de um 0-2 e aplicar um vexaminoso 5 a 2 em seu maior rival (em termos de relevância) londrino com o ímpeto de um time campeão. Van Persie, Walcott e companhia fizeram um verdadeiro desfile para seus torcedores, tiveram sua melhor atuação na temporada, de longe, e mostraram que esse grupo está longe de ser o time pálido e sem brio que muitos apontavam por conta dos resultados desfavoráveis na Premier League, da colocação mediana e da virtual eliminação na Champions. O Arsenal terá que arcar com a ausência de títulos na temporada, mas essa atuação específica redime parcialmente os momentos mais baixos da temporada (a goleada contra o United, os 4 a 0 para o Milan) e contraria muito os comentadores que viam, até com alguma razão, esse escrete como um amplo repositório de sangue de barata.

Existe também o kairos falhado, aquele momento oportuno tornado inoportuno porque uma determinada ação intempestiva se mostra um verdadeiro equívoco diante das circunstâncias que estão em jogo. Neste último domingo, o maior exemplo foi o zagueiro Dedé, na derrota do Vasco para o Fluminente por 3 a 1 na final da Taça Guanabara. Depois que o clube da cruz de malta tomou seu terceiro gol, Dedé repetiu um perfil outrora vitorioso e decidiu assumir o comando de energia da equipe como já fizera, e bem, em jogos decisivos da Copa Sulamericana. A lição dura da semana é que o kairos não é reprodutível em qualquer lugar nem em qualquer tempo — isso está contido na própria definição do termo, e o que vimos em campo foi um melancólico exemplo de jogador à deriva esperando a situação consagradora que nunca viria. Quando se falha o momento oportuno, tudo que se vê é excesso e desorientação, e depois dos 3 a 0 Dedé virou essa trágica figura em busca de uma catarse mas sem qualquer “leitura de jogo” ou força de termômetro para ocupar o espaço exato do gramado para fazer a diferença, ou mesmo servir de motor para o time. Ao contrário, o que se viu foi um craque desandado tantando ser meia-armador, depois ponta e por fim centro-avante, com infatigável disposição, comovente até, porém mais desesperado do que raçudo. Se antes era a raça que contagiava na Sulamericana, dessa vez foi o desnorteamento, e o Vasco com Dedé-atacante parecia pior, mesmo na necessidade cega de fazer três gols em 25 minutos, do que o Vasco com Dedé-zagueiro. Não foi ele a razão da derrota – esta foi ocasião de dois deslizes, um pênalti tolo de Fagner e uma antecipação falha de Fernando Prass num chute venenoso de Deco -, mas, como é comum no craque, para bem e para mal, ele encarnou aquilo que estava latente no grupo, e foi a maior fonte de dramaticidade vinda do lado do clube da caravela. O olhar ao final não era de desapontamento, de reconhecimento diante da ironia do destino que é um time com 100% de aproveitamento perder na final para um time que não teria se classificado se o Vasco facilitasse um jogo para o Boavista; era um olhar de “o que está acontecendo?”. Jovem e grande jogador que é, ele terá tempo de descobrir e aprender com o infortúnio que protagonizou e do qual padeceu diante dos olhos do Rio de Janeiro inteiro. O momento é oportuno.

 

Algumas observações sobre temas candentes

1. Ficar o tempo todo trocando de treinador não é um sinal de quanto um time vai mal. É sinal de quanto uma diretoria é incapaz de pensar a médio e longo prazo, fingindo apagar labaredas quando há um incêndio muito maior sendo abafado, e esse desastre subterrâneo quase sempre está na desorganização, no conflito imediato de interesses ou na ausência de uma toada que cadencie um período de vigência. Nessa semana, muito a se discutir sobre isso, com alguns treinadores que volta e meia aparecem nesse tipo de berlinda, como Caio Júnior e Wanderley Luxemburgo, mas também com um que não costuma frequentar as listinhas do chama-e-cai, André Villas-Boas, atual treinador do Chelsea. A discussão sobre Caio Júnior é um tanto patética. Independente dos fracos resultados obtidos pelo Grêmio nas oito rodadas (!!!) em que liderou o clube, demitir um técnico com base apenas nesse curto período de trabalho é um atestado duplo de incompetência da parte da diretoria, primeiro porque é uma confissão de que errou no começo, e em segundo lugar porque sequer deu uma chance justa de fazer valer uma aposta de trabalho. A dança do entra e sai da posição de treinador diz muito, muito mesmo sobre o futebol brasileiro no que ele tem de mais amadorístico e burro. É verdade que o momento certo do técnico ser mandado embora é um assunto delicado que envolve relacionamento com diretoria, relacionamento com os jogadores e resultados obtidos. Desses, só o terceiro é plenamente claro para o admirador do esporte, e os dois primeiros cabem às especulações ou aos furos de reportagem dos jornalistas. No melhor dos mundos, um treinador deve ter a tranquilidade com a diretoria e com seu elenco para fazer o trabalho que determina. Mas de acordo com quão um ambiente está ocupado por arrivistas, arruaceiros ou indisciplinados (dirigentes incluídos), a estabilidade no cargo é cada vez mais incerta.

Independente da ausência completa de dados, é possível dar seus tostões sobre as demissões de técnicos. A uma demissão de técnico após oito jogos, nem cabe análise minuciosa. É simplesmente uma trapalhada. No caso de André Villas-Boas e sua possível impermanência no Chelsea, a discussão é mais matizada. Sabe-se da sede do magnata Roman Abramovich por sacar treinadores que não correspondem rapidamente a objetivos imediatos, mas no caso de Villas-Boas a situação não parece ser tanto fundada em resultados, mas na ausência de um padrão de jogo e posicionamento em que o time possa se organizar e jogar com tranquilidade. O Villas-Boas do Chelsea 2011-2012 parece ser uma má versão do que Alex Ferguson faz com o Manchester United: um time titular de quinze ou dezesseis, só que num essa estratégia surge como opção de jogo, e no outro transparece o caráter de experiência, de tentar encontrar no meio da competição a identidade e o padrão de jogo da equipe. Um ponto que parece ter sido apontado pelos defensores do técnico foi o modo como ele conseguiu renovar as estrelas do time, virando de Lampard e Drogba os holofotes e desviando-os para Daniel Sturridge e Juan Mata. Por outro lado, as experiências efetuadas no meio-de-campo a partir da lesão de Essien e da decadência de Lampard não podem ser consideradas exatamente satisfatórias. Durante os últimos meses rodaram pelo meio-campo azul-londrino Mikel, Essien (recuperado nas últimas semanas), Romeu, Raul Meireles, Ramires, Lampard, Mata e eventualmente Malouda jogando entre ponta e meia, e a cada jogo a mobilidade do meio-campo é alterada e oscilam gravemente quesitos como segurança, velocidade, opções de profundidade e controle de bola. Ramires vai de segundo volante a quase atacante, Mata é jogado uma hora ou outra para atuar na lateral do campo, Raul Meireles é relocado para primeiro volante (como ontem, com o Napoli, logrando resultados muito insatisfatórios com sua atuação) ou tem que ocupar um terceiro meia, posição na qual ele parece muito desconfortável. Independente da posição na tabela da Premier League (um quinto lugar muito, muito longe da briga pelo título) ou da possível eliminação nas oitavas-de-finais da Champions League, a justificativa mais legítima para a saída de Villas-Boas é a bagunça meio-campista que ele nunca arrumou (há outras possíveis contestações, como apostar em Bosingwa ou Romeu, ou ainda não usar Malouda com mais frequência).

2. Mas o assunto da futebolândia é a iminente eliminação dos dois times ingleses restantes na Champions League. Já que os dois times de Manchester foram eliminados na fase de grupos, cabe a Arsenal e Chelsea manter a presença inglesa na competição, e fazer valer a escrita de que desde a temporada de 1996-1997 há pelo menos um time da Inglaterra nas quartas-de-final da mais importante competição europeia. Na verdade, a estatística fica mais dramática se notarmos que, das últimas sete competições, em seis houve um time inglês na final, em três temporadas houve três clubes ocupando 75% das vagas dos semifinalistas e em duas delas houve um campeão vindo da Inglaterra, com destaque para a final caseira entre Manchester United e Chelsea em 2008.

São números grandiosos o suficiente para começar a falar sobre uma possível decadência do futebol inglês na comparação com outros clubes e países da Europa. Mas números e performances podem ser enganadores e contar apenas parte da história. Um exemplo a ser dado vem do curioso fato de que são times italianos que estão prestes a eliminar os dois remanescentes ingleses, ambos londrinos, e que um deles já tratou de despachar o atual contendor a campeão da Premier League ainda na fase de grupos. Estamos prestes a uma quarta de final de Champions League com três times italianos e nenhum time inglês, mas observando semanalmente as atuações dos clubes em seus campeonatos caseiros, seria absolutamente insano supor uma superioridade italiana na beleza do futebol praticado, na riqueza tática ou no talento individual de alguns jogadores (afinal, para cada Ibrahimovic há um Van Persie, para cada Sneijder um Giggs e assim por diante). Apesar das constrangedoras eliminações precoces, os dois times de Manchester são muito mais times do que qualquer dos italianos que postulam suas chegadas às quartas da Champions. O Napoli é um desses apaixonantes casos de superação, e pode render ainda muitas emoções na competição, mas é evidentemente um time irregular que não consegue reproduzir no dia-a-dia de trabalho o alto padrão que tem mostrado nos jogos decisivos contra times europeus. A Internazionale, hoje fora da zona de classificação para a Europa League no ano que vem (assim como o Napoli, aliás), se conseguir chegar um pouco longe na Europa, deverá agradecer a sua camisa e a sua camisa apenas. Sobra o Milan, esse sim o único aparentemente capaz de chegar a uma final em condições de disputar, graças a um dos 4-3-3 mais malucos já criados nos últimos anos e a um entrosamento monstro da equipe, além dos óbvios talentos individuais em defesa, meio e ataque.

Independente de um Milan forte e de um Juventus renascido, o futebol do campeonato italiano de 2011-2012 é um futebol murrinha, apequenado, raquítico em emoção, a anos-luz da distância de alguns dos jogos que a Premier League já viveu esse ano, históricos (a goleada do City contra o United no duelo de Manchester, ou a bordoada do United sobre um Arsenal atônito), ou os eliminatórios das copas britânicas, alguns inclusive mencionados em colunas passadas. E não é o argumento do vibrante-porque-disputado com que muitos tentam safar o futebol praticado no Brasil não. É disputado porque bem jogado mesmo. Nesse quesito, a que distância o Tottenham, terceiro inglês, está da Udinese, terceiro italiano, ou Lazio e Roma estão de Chelsea e Arsenal. Mas a comparação é protocolar. Ela não serve para muita coisa, mas serve para relativizar o bafafá em torno do mau desempenho dos times da Inglaterra na liga europeia. A Champions League é o grande campeonato mundial, mas não é o noves fora que dá atestado de qualidade a campeonatos nacionais. Os clubes ingleses podem dar adeus à competição europeia ainda na fase de oitavas, mas a Premier League segue intocada como o mais coeso e bem jogado campeonato nacional do mundo.

3. Assistir a Stevenage X Tottenham pela F.A. Cup traz comparações mentais curiosas. Quando se vê time grande jogando em estádio de time pequeno no Brasil, as circunstâncias são as piores possíveis, e tudo é perpassado por uma atmosfera de indigência e pauperismo, geralmente com um exíguo número de espectadores e a impressão de que todas as instalações precisam urgentemente de reparos. O Stevenage é um time da League One, a terceira divisão da Inglaterra, e seu gramado não é propriamente um primor (estava ruim, para ser exato), mas que diferença em ver um estádio modesto mas charmoso (capacidade 7100 torcedores), todo ocupado por um público vibrante formando um conjunto orgânico, uma boa visão de se ter quando nosso pão de cada dia é estar acostumado a precariedade em todos os níveis, dos grandes estádios que já parecem carcaças aos pequenos estádios que parecem pedir para ser sacrificados. Mas deixemos a inoperância dos operadores tupiniquins para outra ocasião, porque já falamos muito dela, e fiquemos com a graça comovente de ver um dos grandes ingleses jogar num campinho minúsculo e meio tosco, porém gracioso.

 

O passarinho do Nelson na era da ubiquidade do videotape burro

A lição do Nelson Rodrigues cronista futebolístico é clara: o futebol é épico e o recurso à objetividade o reduz a um joguete de dados informativos, finalmente banalizando aquilo que deveria ser o último repositório cego da paixão. Um passarinho inventado num incêndio vagabundo pode ser uma mentira, mas ele redime o fogo e cria uma carga de dramaticidade que restitui ao evento sua vibração original. Da mesma forma, o videotape, que permite a análise da jogada em posições de câmera e velocidades diferentes, noves fora o deslumbre da tecnologia, acaba transformando a emoção em um discurso de certo e errado, o que pode ser muito bom para juízes e para dirigentes reclamões, mas desvirtua o calor da discussão para um papo praticamente oposto à beleza e aos circuitos de emoção de que o esporte é feito.

Glauber Rocha, polemizando, dizia que Machado de Assis era o rio encanado enquanto José de Alencar era o encontro do Rio Negro e do Solimões. Não precisamos concordar para entender que o passarinho e o videotape burro de Nelson Rodrigues encontram-se nesse mesmo registro grandioso, de uma prática jornalística-artística que transporta e comove através da linguagem, e assim faz jus à opulência dos sentimentos que o futebol desperta.

Diante de tudo isso, dizemos: é ótimo se isso render um Nelson Rodrigues. Só que a invenção de passarinhos em incêndios não está restrita aos gênios, e em geral as discussões de videotape burro têm entre seus interlocutores os chatos de botequim fechados em suas próprias verdades, não os dramaturgos fascinados pelas catarses da experiência humana.

Há, no entanto, uma mudança ainda mais séria a pôr em risco o triunfo da imaginação sobre a objetividade: é que de lá pra cá a confiança na evidência da imagem aumentou, e efetivamente se não vemos um passarinho em meio às chamas, esse passarinho não existe. Antes o estatuto da escrita tinha a força de um mandamento escrito em mármore: era o registro da imortalidade dos grandes feitos. Hoje é apenas a tirinha modesta que mostra o passarinho, e à imagem, essa sim, onipresente, total, panóptica, cabe brilhar.

Atualmente, é impensável discutir sobre objetos ausentes da imagem sem suspeitar de sua não-existência. Podemos pensar na segurada de camisa de Júnior Baiano na Copa do Mundo, uma infração marcada pelo juiz mas não ratificada por nenhuma câmera de vídeo que cobria a partida no estádio (a correção veio após o jogo, no testemunho único de um fotógrafo que flagrou o momento do agarrão). Ou, mais pateticamente, no objeto pesado que teria sido jogado na cabeça do então candidato à presidência da república José Serra, e que rendeu-lhe por algumas semanas piadas com a expressão “bolinha de papel”.

O passarinho do Nelson, convenhamos, é hoje impossível. Suas premissas, no entanto, são talvez ainda mais urgentes, no jornalismo e fora dele. O comodismo e o consumismo são parentes próximos do sedentarismo intelectual, e nossa era anda tão maravilhada com as potencialidades do LED, do HD, dos iPads e dos smart phones que se crê plenipotenciária quando, na verdade, está apenas mais dependente de dados e de coordenadas inofensivas para preencher seu cotidiano. Alguns chamam isso de diversão. A banheira de pequenas emoções encanadas nunca esteve tão cheia, mas o épico permanece do lado de fora da janela, rindo do Narciso de aquário em regime de perene autocomplacência. Pobre São Tomé de dedos enrugados, e todos nós somos um pouco essa figura, cada vez mais contemporânea.

O que não pode escapar de vista é que a escrita – e no caso a escrita sobre esportes – permanece tendo poder transportador à medida que filtre informações e forneça ao leitor condições de unir ou sintetizar imagens (linkadas ou narradas, pouco importa) capazes de transportá-lo e transformar a leitura numa aventura do pensamento e da sensibilidade. Remeter ad infinitum para a era dos passarinhos chamuscados e da burrice do VT é uma bobeira que derrapa ora na preguiça, ora numa incompreensão do tempo que se vive. É preciso lutar contra algumas das marcas desse tempo, não com as armas de Nelson, que simplesmente não surtem efeito hoje em dia, mas com seu instinto e com o clamor do épico que ele tanto defendeu.

Lutar assim, hoje, não é mandar às favas os tira-teimas e as estatísticas. Eles já são instituições da análise esportiva, e eventualmente nos permitem compreender de fato o que ocorre em campo. O fundamental é saber que o esporte não se reduz a isso, a taxas de acerto, a apitos desleixados, a linhas de impedimento, a porcentagens de desarmes realizados. O neoprimitivismo mitificante é tolo, mas a análise robótica não fica atrás em níveis de idealismo pseudocientífico. Nenhum risco, no entanto, em flertar com ambos sabendo das deficiências inerentes a cada um dos modelos.

A luta a ser travada, sempre, é saber que o holofote deve estar no drama humano. O videotape pode ajudar, o tira-teima também, a reprodução dos melhores momentos etc. Mas é o drama da vitória, do arranque, da plasticidade, da superação, da articulação tática, de todas as variáveis, que compõem a experiência esportiva. E é igualmente necessário saber que a escrita não é apenas um veículo através do qual o drama é narrado, mas que ela também é parte dele. Não com adjetivações de valor questionável ou descrições superlativas, mas simplesmente através da seleção do momento a contar (algo que o VT pode fazer também) e do engenhoso lapidar das circunstâncias que envolvem esse momento, psicológicas, físicas, emocionais, lógicas e outras (o que está muito aquém do registro de imagens e dos efeitos pós).

A luta é dar tempo à reflexão, restituir à experiência sua dramaticidade e fazer da escrita mais um palco do teatro vital, que move tanta gente em busca de emoções a fim de quebrar o ramerrame tedioso da objetividade cotidiana.

As estrelas do espetáculo

Bastian Schweinsteiger

A boa nova para a equipe do Bayern de Munique é que Schweinsteiger está recuperado de sua operação na clavícula e que já pode assumir a titularidade e o controle do meio-de-campo de seu já estelar clube. A notícia ruim é que há bons jogadores demais na meia do mais famoso dos times alemães, e que a opção de Jupp Heynckes por escalar todos os talentos não vem rendendo os objetivos desejados, tanto em resultados quanto em padrão de jogo. Em termos práticos, desde que a Bundesliga retornou de sua pausa de inverno, o Bayern já perdeu cinco pontos e a primeira colocação para o atual campeão Borussia Dortmund. A atuação de Schweinsteiger nada tem a ver com isso, mas o dilema de Heynckes pode ter. Contra o Hamburgo, e já antes vitoriosamente contra o Wolfsburg, Heynckes optara por escalar os melhores jogadores, com um meio formado por Schweinsteiger, Kroos, Robben e Ribery, com o titular desse subtítulo ocupando a função de primeiro volante outrora submetida a Tymoschuk ou Luiz Gustavo. Contra o Wolfsburg o resultado foi farvorável, mas neste último sábado contra o Hamburgo o meio do Bayern pecou pelo excesso de previsibilidade, já que Schweinsteiger e Kroos tinham poderes limitados para ir à frente e Robben e Ribery ocuparam os lugares que se esperam deles, tornando o ataque bávaro muito pouco dinâmico em termos ofensivos. Some-se a isso uma persistente fase ruim de Thomas Müller e você tem um time ameaçado por seus titulares compulsórios que, ainda que joguem muita bola, podem ser relativamente inoculados dadas suas posições mais ou menos estanques no campo. Independente dos esforços individuais, o Bayern foi um time obstinado porém apático, e não conseguiu sair de Hamburgo com nada além de um empate suado.

Philip Lahm

A nota negativa do jogo, no entanto, coube a Lahm, esse lateral de evidentes qualidades defensivas e ofensivas que deixou muito espaço sobrando por seu lado de campo, e em uma das ocasiões isso se provou fatal. Pode-se atribuir essa facilidade de acesso pelo flanco direito do ataque à defesa improvisada do Bayern, com o volante Tymoschuk ocupando a lateral-direita enquanto Boateng, um jogador-coringa que eventualmente faz às vezes de lateral, formou zaga com o titularíssimo Badstuber. Em todo caso, o fato é que o lado de Tymuschuk sofreu muito menos do que o de Lahm, e talvez a figura do volante de ofício tenha feito alguma falta para conter os avanços do adversário, mas à fria (e porventura injusta) luz da evidência foi de Lahm a maior responsabilidade pelo tento sofrido por sua equipe.

Juan Mata

Já nos territórios insulares da Europa, a Premier League viveu um grande jogo cheio de emoções e reviravoltas no placar. Foi o Chelsea 3 X 3 Manchester United em Stamford Bridge, com direito a uma abertura de vantagem de 3 a 0 do time da casa e uma improvável recuperação dos mancunianos, com direito a dois gols de pênalti, um dos quais, o segundo, fruto puramente da imaginação do árbitro Howard Webb. Seja como for, o grande gol do jogo (e da toda rodada do fim de semana, aliás) coube a Juan Mata, que marcou o segundo da equipe londrina fulminando a meta de De Gea com um voleio vindo de um certeiro cruzamento de Fernando Torres. Isolando os lances e o resultado, foi o mais belo momento do jogo, de plasticidade única, mas também serve como recompensa àquele que vem sendo, junto com Sturridge, o grande nome da equipe do Chelsea na temporada 2010-2011.

Wayne Rooney

Ele tem o direito de se sentir o jogador mais injustamente sacrificado dos grandes times da atualidade. Afinal de contas, enquanto jogou como atacante, Rooney jamais deixou a desejar em termos de empenho e criação de jogadas, mesmo nos tempos em que a seca de gols ocasionou boatos de que o grande atacante já vivera melhores dias. A excelência de Chicharito como goleador na temporada passada e a ascensão de Welbeck na atual, associada à ausência de um grande meia para fazer par com Giggs na armação do United, fez com que Rooney se tornasse uma escolha possível, ainda que estranha, para ocupar a posição de quarto meio-de-campo. O mínimo a se dizer é que Rooney tem feito jus à mudança tática operada pelo técnico Alex Ferguson, e pode-se dizer que a variação de posicionamento fez com que sua liderança fosse ainda mais sentida, positivamente, pelo elenco. Ignoremos as duas primorosas cobranças de pênalti que deram os dois primeiros gols ao Manchester. Basta olhar a maneira como ele pega a bola na rede, nas duas vezes, sem comemorar, sem vibrar, consciente de que aqueles são apenas dois trunfos passageiros na construção de um placar favorável por vir. Com três gols na conta negativa, suas corridas ao círculo central para recolocar a bola em jogo mostravam patentemente um líder disposto a muito mais do que fazer um golzinho de desconto. Rooney é o pulmão e o coração de sua equipe.

David De Gea

Até o presente momento, De Gea só chamava a atenção em momentos de falha flagrante ou lances desajeitados que o caracterizavam como alguém a quem não se deve atribuir confiança. Pode ser que o futuro confirme esse aspecto, que é sério e recorrente, mas nesse jogo contra o Chelsea, De Gea teve uma partida fabulosa, e mesmo tendo tomado três gols (sem culpa em qualquer um deles, diga-se), teve uma atuação formidável, digna de goleiro do primeiro escalão do futebol mundial. Em especial um chute de Juan Mata que tinha como alvo certeiro o ângulo, em que o jovem goleiro espanhol mostrou habilidade sobre-humana para alcançar e colocar a escanteio. Considerando as mui justificadas críticas que vem recebendo, perdendo por vezes a titularidade para o também irregular Lindegaard, a novidade vem como um quase milagre para os já desenganados torcedores do United: é possível ter novamente um goleiro confiável. Resta saber se o futuro confirmará o prognóstico favorável dessa espetacular atuação.

André Villas-Boas vs. Alex Ferguson

A despeito de um pênalti pessimamente marcado pelo árbitro Howard Webb, Chelsea X Manchester United foi decidido nas substituições operadas pelos treinadores de suas equipes. O comandante português do Chelsea optou por retirar Sturridge de campo para dar lugar ao volante Romeu, enquanto o longevo escocês que comanda o Manchester optou por adiantar Giggs colocando Scholes no meio-campo e adicionar mais um atacante, Chicharito, forçando o meia-direito Valencia a ocupar a lateral, cobrindo o substituído Rafael. A partir dos 10 do segundo tempo, o Manchester foi senhor das opções ofensivas e do controle da bola, frequentando cada vez mais a grande área adversária. Sobretudo depois da substituição do Chelsea, o time de Londres não logrou o menor sucesso em impedir os avanços do rival, e conseguiu isolar suas chances ofensivas ao ter como opções de saída de bola Raul Meireles, Romeu e um Essien ainda longe do melhor ritmo de jogo. O gol de  empate veio de um cruzamento de Giggs, agora livre no apoio, para o pequeno Chicharito, sozinho para cabecear entre os dois zagueiros do time da casa. Que tenham sido dois jogadores remanejados por Ferguson, isso pode ter sido um capricho do destino. Para os que acompanhavam a partida, no entanto, o lance surgiu apnas como o ato consumado que provou uma superioridade patente e de uma maior vontade de vencer. O resultado não foi o melhor dos mundos para o Manchester United, que viu seu rival de cidade isolar-se na liderança ao fim da rodada. Mas naquele momento em Stamford Bridge, havia apenas um time vitorioso, e esse era o clube visitante.

 

Ases de copas, dois de ouros

Existem aqueles que minimizam a importância das copas que transcorrem em paralelo aos campeonatos nacionais da Europa e à Champions League. Os argumentos são justos e é verdade que a longo prazo esse tipo de título tende a ser visto como uma conquista de consolação celebrada na ausência de algo maior para comemorar. No entanto, eles existem e os clubes se esforçam para vencer essas competições, geralmente poupando esforços nas primeiras rodadas mas passando a ir com tudo uma vez que o time atinge as fases mais adiantadas do mata-mata. A discussão em torno dos méritos desse tipo de troféu, no entanto, tende a ser fastidiosa depois que se iniciam as ideias preliminares, já que não dá pra sair muito além da bipolaridade em torno dos argumentos “não vale um campeonato” e “é um título”. O fato efetivo é que nenhum time entra em disputa pra perder. E outro, pontual para os dias de hoje, é que essas copas produzem jogos capazes de alterar o moral e o desempenho de certos clubes em momentos decisivos, chegando eventualmente a reordenar as partilhas de forças construídas ao longo das temporadas.

No caso das retas finais das copas europeias desse ano, há três vencedores, ainda que não se sagrem campeões. Dois desses vencedores, curiosamente, são adversários e um está inclusive eliminado. Ainda assim, é inevitável a percepção de que Liverpool, absoluto, mas também Barcelona e Real Madrid saem com a energia revigorada depois dos resultados da última semana em suas disputas de copa nacional. O Liverpool conseguiu a façanha de eliminar os dois maiores bichos-papões da Inglaterra em duas competições diferentes, os dois grandes de Manchester que ocupam com distância folgada as duas primeiras colocações do campeonato. Já o Barcelona eliminou o Real Madrid no segundo jogo da Copa do Rei, mas a verdade é que el clásico já é uma espécie de título por si só. Mas, mesmo eliminado, o que o Real Madrid jogou contra o Barcelona ajuda a apagar a imagem de time amedrontado pela superioridade do rival. O que o time de Madri jogou no Camp Nou foi o futebol de um time brioso que impõe seu estilo, e ainda que o resultado final tenha sido desfavorável, a superioridade em termos de lances perigosos ficou evidente, e isso é algo que os torcedores do Real devem comemorar. E muito.

Mas a grande sensação mundial da semana foi o Liverpool. Os comandados de Kenny Dalglish superaram de forma emocionante o Manchester United pela FA Cup (= Copa da Inglaterra) no último fim de semana, pela quarta rodada da competição (fase de 32, ou pré-oitavas). Em termos de emoção e intensidade, contudo, foi o jogo contra o Manchester City pela Copa da Liga (= Carling Cup) aquele que alçou o Liverpool a um patamar heroico na temporada, fazendo o time chegar a uma final e ser finalmente apresentado ao novo Wembley, onde será disputada a final contra o Cardiff. Novesfora estar vivo em ambas a competições, existe o fator estratégico, psicológico e moral de bater nessas copas as duas equipes merecidamente mais badaladas da Inglaterra. Sobretudo num momento em que os doze meses de Kenny Dalglish no comando do time não serviram muito para subir o Liverpool na tabela da Premier League. Se sua principal tarefa era voltar ao big four, o resultado efetivo, olhando hoje a tabela, é admitir apenas um lugar modesto no mid five, esses cinco times que lutam sem sucesso para acompanhar os times de Manchester na classificação (a saber, Tottenham, Arsenal, Chelsea, Newcastle e Liverpool). Ainda que nos números do campeonato a presença de Dalglish não se imponha de forma marcante, o espírito da equipe está significativamente mudado de um ano para cá, e parte disso é visível nas duas passagens pelos mata-mata dessa semana.

O Liverpool de Kenny Dalglish é um time raçudo e atlético, compensando em esforço e disposição o que não tem em brilhantismo. É um time que deveria depender do talento de Steven Gerrard, e que ainda aposta nele como maestro de sua equipe, um lance que é uma mistura de gratidão (pelas glórias passadas) e desespero (porque não há outra opção no horizonte). Na impossibilidade de Gerrard ocupar o papel que deveria ser seu (um tanto por suas contusões, outro por ser naturalmente oscilante), o Liverpool se reorganiza como um time fisicamente muito atlético no meio-campo, que confia ofensivamente nas disparadas dos meias Henderson e Downing nos lados de campo ou nas subidas dos laterais Campbell e José Enrique, que na melhor das hipóteses conseguem colocar a bola no pé de atacantes em condição de marcar. Um deles é gênio, Suárez. Em sua ausência, existe a garra de Craig Bellamy, a mobilidade de Kuyt ou o sabe-se-lá-o-quê de Andy Carroll. Contra o City na quarta, foi a garra que venceu, com uma atuação brilhante de Bellamy, que quase vomitou os bofes em campo, foi o termômetro de energia da equipe e terminou recompensado ao fazer o gol do empate que garantiu a passagem do Liverpool a uma final inglesa pela primeira vez em seis anos.

É uma coisa estranha de se dizer, mas o Liverpool lembra um pouco o futebol brasileiro dos últimos anos, ao menos na forma de conjugar disposição tática, força de marcação e ataque verticalizado pelas laterais. Com Suárez há mais opções, devidas à mobilidade do jogador e a seu talento. As forças do Liverpool de Dalglish, em todo caso, são a disciplina e o posicionamento na marcação, que garantem uma equipe coesa defensivamente e disposta a contra-ataques perigosos. Posto assim, é até explicável que o time brilhe nas partidas grandes e nos mata-matas, mas que empate excessivamente em seu próprio estádio (em que a prerrogativa do ataque é do time da casa) ou perde pontos preciosos contra times menores (igualmente armados na defesa). A posição do Liverpool nas tabelas inglesas dessa temporada é a antípoda de um paradoxo: ela é o espelho de um time aplicado mas que não sabe trabalhar a bola quando tem volume de jogo e uma defesa bem armada a transpor.

Na Europa continental, temos o duelo dos dois melhores times do mundo. E a grande novidade dessa volta da Copa do Rei, a bem-vinda novidade, foi que o Real Madrid efetivamente jogou como um dos dois melhores times do mundo, e no primeiro tempo poderia ter desferido um placar vergonhoso contra seus rivais da Catalunha, com direito a um tiro maravilhoso de Ozil, uma falha grotesca de Gerard Piqué logo no primeiro minuto de jogo e uma ou outra defesa perigosa de Pinto, que aliás também cometeu um erro grotesco de saída de bola não aproveitado pelo time de branco. Como quem não faz leva, o Real foi punido com dois gols no final da primeira etapa em que brilharam as estrelas de Messi, em mais uma arrancada sublime e um passe certeiro para Pedro Rodríguez, que substituíra Iniesta, machucado, e de Daniel Alves, com um fulminante tiro na entrada da área que acertou o ângulo de Casillas, já nos acréscimos.

O primeiro tempo foi do Real, com o ritmo do Real, e o Barcelona saiu vitorioso. No segundo tempo, o ritmo foi do Barcelona, com maior toque de bola, mas os erros de passe do primeiro tempo continuaram ocorrendo ‒ atribuíveis apenas até certo ponto à marcação do time de Madri ‒, e dessa vez os atacantes da capital espanhola souberam aproveitar, e Ozil deu um magnífico passe para Cristiano Ronaldo botar na frente, limpar do goleiro e tocar para o gol vazio, e poucos minutos depois Benzema receber um rebote vindo de falha individual de Xavi, dar um balão desconcertante em Puyol e tocar para o gol. A grande pergunta: o 2 a 2 representa o que foi o jogo? A resposta é dupla, oposta, esquizofrênica: se formos olhar os melhores momentos, não, mas se prestarmos atenção aos demais fatores envolvidos, sim. O Barcelona errou como poucas vezes acontece, e sofreu com atuações individuais sofríveis de Xavi e Fabregas, que apareceram pouco e mal no jogo. Mas o Real Madrid, por sua vez, novamente se mostrou incapaz de conter a mobilidade dos atacantes e meias do Barça por outro meio além das faltas, e deve dar-se por contente de não ter terminado o jogo com oito em campo (ironicamente, Pepe não está entre os que deveriam ter sido expulsos). O Barcelona sai como vencedor por ter jogado seu pior jogo decisivo em anos e ainda assim ter saído com um empate. O Real Madrid também sai como vencedor, mesmo derrotado, por ter provado que pode jogar seu jogo e derrotar seu maior rival sem ter que se armar taticamente como time pequeno. A nota amarga é a constatação de que as simulações de agressão e a catimba chegaram para ficar no clásico, com situações embaraçosas para Pepe, Piqué, Fabregas e Busquets.

Como nota final desta já longa coluna, gostaria de limpar a barra dos árbitros de ambos os 2 a 2 decisivos das copas. Não que eles tenham tomado todas as decisões corretas. Mas em nenhum momento foi tomada uma decisão que não fosse plausível ou coerente com a lógica seguida desde o primeiro minuto. Torcedores do Manchester City reclamam de um pênalti sofrido por Dzeko (que de fato aconteceu) e da marcação do pênalti por bola batida na mão de Micah Richards (lance interpretativo, em que pode plausivelmente ser argumentado que um defensor com os braços abertos estende ilegalmente seu corpo e que mesmo um toque sem intenção constitui infração), mas ambos são lances muito rápidos e fáceis de analisar apenas depois da câmera lenta. No caso de Barcelona e Real Madrid, a reclamação pela expulsão de Sérgio Ramos é ridícula. Ele cometera minutos antes uma falta besta, deixando um pezinho maroto para desarmar contra-ataque, sem luta por posse de bola, e antes dele Diarra já merecia ter sido mandado para o chuveiro antes de terminar o primeiro tempo. Coentrão é outro que poderia ter tranquilamente recebido o segundo amarelo. Diante disso, expulsar Ramos no finalzinho do jogo, mesmo que tenha sido por uma simulação em que Busquets barganhava uma agressão via cotovelo, é algo a se ctiticar? E puxar braço de marcador para ficar livre em bola parada e finalizar para dentro, ficou legítimo agora? O Real Madrid vale bem mais que isso, mas em certas horas nem os jogadores parecem lembrar…

A história se escreve, a golpes de destino, a golpes de casualidade, a golpes que são simplesmente golpes

Dois jogos de extrema importância para o cenário internacional aconteceram nessa última semana. Uma enorme lacuna separa esses jogos em termos de categoria, de força tática e até mesmo dos objetivos que estão em jogo, mas ainda assim foram dois jogos que carregaram a efígie histórica do futebol, aquele lance de dados que separa o lendário do regular, o notável do comum. O primeiro deles, indubitavelmente mais jogo, foi mais um embate entre Barcelona e Real Madrid, na casa deste último, na primeira rodada da Copa do Rei. O segundo foi no domingo, um jogo que ameaçava ser moroso mas que, pelo emocionante segundo tempo e pelas conclusões que se podem depreender de seu resultado, também alçou-se acima da regularidade costumeira. Foi Manchester City contra Tottenham no Etihad Stadium, em Manchester.

Desde que José Mourinho assumiu o Real Madrid e acirrou para níveis que ultrapassam a rivalidade histórica (como se fosse pouco), “el clásico” é o espetáculo mais dramático que o futebol pode mostrar. É também o mais completo do que podemos ver em termos de futebol, no papel e na prática, ainda que o papel e a prática divirjam. No papel, é um embate entre os dois melhores times do mundo. Na prática, é o Barcelona funcionando em seu mais alto nível de integração coletiva e comportamento tático. Desde que apanhou dos humilhantes 5 a 0 na Catalunha, Mourinho tenta encontrar um esquema tático para embolar o meio de campo, minimizar as trocas de passes do adversário e sua consequentemente escorchante posse de bola, e ainda assim mostrar-se decisivo no que o time tem de melhor, os contra-ataques e o jogo em profundidade. É talvez a maior humilhação para um treinador que se crê o maior do mundo: ter que armar seu time para jogar diferente diante do maior rival, não só rearmando taticamente a equipe mas também  tirando coelhos da cartola, trocando jogadores de posição e barrando titulares de forma duvidosa. Articulistas comentaram como um trunfo o fato de que novas goleadas não surgiram, mas a verdade é que em nenhum momento o time azul-grená teve sua superioridade técnica e tática ameaçada. Com sangue frio, o Barcelona sempre soube esperar o momento de vencer, e assim aconteceu seguidamente na campeonato nacional, na semifinal da Champions League e na Supercopa da Espanha, tudo isso na temporada passada. Nesse período, apenas uma Copa do Rei para o Real Madrid, com o título conquistado na prorrogação, ou seja, sem demonstrar sua superioridade no tempo regular, seja no aspecto “título moral” seja efetivamente com a vantagem no placar.

A temporada 2011-2012 acena fortemente com a possibilidade de um campeonato nacional indo para Madri, mas no que diz respeito à rivalidade de “el clásico”, o jogo desse meio de semana mostrou que Guardiola e seus comandados permanecem sendo o grande time do planeta. Mas o que foi mostrado do outro lado é que Mourinho ainda luta loucamente para criar um esquema que impeça o Barcelona de jogar seu jogo e, como os mais risíveis vilões de desenho animado com sonhos de onipotência, termina bufando de raiva ou caindo no desfiladeiro moral ao ver suas apostas novamente fracassando diante não só do resultado – o que, claro, é decisivo, mas não é só o que importa -, mas também dos avassaladores indicadores de posse de bola, finalizações certas e erradas, etc. E, talvez principalmente, porque jogo a jogo só onze em campo sentem-se senhores de si num “clásico”, e não são os do time de branco.

No jogo de quarta última, assim como no jogo de 10 de dezembro, o Real saiu na frente e pôde praticar mais confortavelmente seu jogo de retranca e contra-ataque. Nos dois jogos, o gol surgiu de eventualidades, uma bobagem de Victor Valdés no primeiro jogo e uma falha de Pinto no segundo, ams é bem verdade que o time de Mourinho teve um ou outro contra-ataque com clara possibilidade de gol, frustrada por passe errado ou mau controle de bola. Quando o jogo assenta, no entanto, a impecável troca de passes do Barcelona obriga os jogadores de branco a correr desarvoradamente na marcação, e a fantástica mobilidade de Iniesta, Messi, Fabregas e cia. inevitavelmente cria espaços que serão utilizados com resultados fatais para o rival. Depois de transformar Pepe num meia, Mourinho apostou em Altintop como lateral-direito, e em ambos os casos as apostas não renderam os objetivos idealizados, porque novamente o Barcelona jogou como quis. Mas, ironia das ironias, o primeiro gol do Barça surgiu também de um lance casual, um escanteio mal marcado em que Puyol apareceu correndo no meio da grande área e cabeceou sozinho para o gol.

Os deuses do futebol, no entanto, parecem rir dos anseios madrilhistas: o gol de Puyol, por mais fortuito que tenha sido o lance, apareceu aos olhos de todos que assistiam à partida, como um desígnio do destino sendo realizado. O efeito, claro, é provocado pela superioridade tática e pelo profundo domínio de jogo do time do Barcelona: a sensação de que uma hora ou outra a bola vai entrar. Se não for num mágico lance de brilho e talento individual, será pela persistência do conjunto. Messi brilhou, para variar, colocando Abidal na cara do gol para dar números finais à partida, mas é o gol de Puyol – a naturalidade do guol de Puyol, melhor dizendo – que revela toda dimensão trágica do controle exercido pelo Barcelona jogando seu jogo mais importante. É o momento do paradoxo em que mesmo a casualidade soa como expressão do inevitável.

Golpes de casualidade também ocorreram, e aos montes, no jogo do Etihad Stadium no último domingo. Um 0-0 morno no primeiro tempo, depois dois gols caídos mais ou menos no colo do Manchester City, depois dois gols brigados e obtidos pelo Tottenham para empatar a partida, e finalmente um gol de pênalti para desequilibrar o placar em favor dos azuis de Manchester. Ao contrário do “clásico”, o segundo tempo de City-Tottenham era sentido como uma partida aberta, imprevisível, e a sucessão de gols parecia oscilar ao ritmo de um misto de oportunismo, talento e garra, mas jamais com o estigma de uma expressão do destino sendo escrito. Ele acaba sendo, eventualmente, mas isso acontece mais pelo placar final do que pelo senso “narrativo” que o jogo cria. Mas se há o trágico do destino, há também a dramaturgia da casualidade, e aconteceu que um jogador iluminado para o bem e para o mal, Mario Balotelli, fosse calçado na grande área, recebido o pênalti e convertido a infração com o sangue frio que lhe é peculiar. O mesmo Balotelli que poucos minutos antes havia chutado maldosamente a cabeça de um adversário caído, num momento em que a bola já estava fora de jogo. Houvesse sido pego em flagrante, o atacante italiano seria imediatamente expulso e consequentemente não estaria em campo ser decisivo momentos depois. Injustiça ou não, são coisas do futebol, e a vitória do Manchester City é o mais perfeito exemplo do que o time é nessa temporada: aquela equipe cheia de talentos mas que funciona meio aos trancos e barrancos, tecnicamente aplicada, brilhante em momentos, porém escorando-se firmemente na sorte para conquistar seu campeonato nacional. Sorte não só de seus resultados, mas também pelo fato de que os grandes times ingleses dos últimos cinco anos, Manchester United, Chelsea e Arsenal, estarem nitidamente em momento de rearticulação e lograrem diversos resultados desfavoráveis. No fim das contas, uma vez o título garantido e o troféu nas mãos do capitão, o campeão entrará para a História, sem apelação ou resmungos dos derrotados. A carga do destino manifesto, no entanto, parece hoje muito distante da temporada 2011-2012 da Premier League britânica.

Há os golpes do destino, há os golpes da casualidade, e há também golpes, simplesmente golpes. O chute covarde de Balotelli em Scott Parker, muito mais perigoso, mas também o pisão de Pepe na mão de Messi, igualmente gratuito e maldoso, não merecem qualquer palavra de glória. Merecem, sim, suspensões. Enquanto escrevo esse texto, Balotelli é cotado para uma suspensão por quatro jogos, enquanto Pepe recebe férias “disciplinares” de seu próprio clube, e ficará fora por duas semanas. Em ambos os casos, e tomadas as variadas proporções das agressões, a sensação é que é muito pouco. Não é nem questão de evocar o fairplay. É que semelhantes formas de deslealdade devem ser repudiadas e exemplarmente punidas. Não são situações de jogo, não é a partida jogada, são irrupções grosseiras de não-futebol que não merecem nada além da infâmia.

Meia-lua de ouro, 2011/2

Um ano é muita coisa. E, em termos de futebol, representa coisa demais, e por isso mesmo pode conter seu quê de injustiça ou justificar escolhas despropositadas. No caso de eleger os melhores jogadores do mundo na virada do ano, ainda há um complicador: na Europa os campeonatos nacionais começam no meio do ano e portanto uma eleição de fim de ano pega uma temporada no meio, em sua primeira metade, e a outra metade, mais decisiva, já escapando da memória. Um recorte semestral pode permitir escolhas tão estapafúrdias quanto o anual, é certo, mas pelo menos ele possibilita um olhar contínuo sobre o desempenho de equipes e jogadores isoladamente, tornando mais patentes as oscilações dos inconstantes e mantendo frescos na memória os melhores momentos e instantes decisivos. Portanto, ao invés de uma bola de ouro, prefiro dividir a pelota no meio e premiar com meias-luas os craques que se destacaram em cada posição na segunda metade de 2011. Através de um método ametódico, sem me basear excessivamente em estatísticas, títulos ou posição no campeonato, mas simplesmente observando a performance individual e como essa atuação altera ou melhora o jogo de sua equipe. Dei preferência, em caso de “empate técnico” entre um ou mais jogadores, àqueles que surgiram como revelação nos últimos semestres (não necessariamente neste apenas). Contusões também servem como elemento relativizador, embora em alguns casos o período de atividade dentro dos seis meses já justifique a escolha. Por fim, existe o limite da visibilidade. É possível que alguns craques estejam jogando no Atalanta, no Hertha Berlin, no PSV Eindhoven, mas simplesmente não os vi. Sem mais delongas, vamos às Meias-luas do semestre final de 2011.

1. Ilke Casillas (Real Madrid)
Difícil pensar em algum outro goleiro que possa estar na posição de maior do mundo nesse momento. Não é só que ele praticamente não falhe e domine todos os fundamentos necessários à sua posição. Sua serenidade transmite toda a confiança necessária a suas equipes (clube e seleção espanhola), e como se não fosse o bastante, Casillas tem um indelével senso de liderança que o torna simbolicamente ainda mais insuperável. Só falta aprender como não tomar gol do Messi, mas aí a tarefa é impossível.
Reserva: Manuel Neuer (Bayern de Munique)

2. Daniel Alves (Barcelona)
Daniel Alves é meu lateral-direito favorito há muitos anos, mesmo na época em que o Maicon arrebentava na Internazionale e na seleção nacional. Talvez um pouco em contraposição à ideia do lateral-mais-atacante-que-defensor e da lógica “lateral tem que ir na linha de fundo” eternizada no Brasil, mas sobretudo porque Dani Alves domina como poucos a marcação de flancos, a hora dos botes, o momento de cercar, além de como apoiador ser rápido, preciso nos passes e cruzamentos, e jamais esquecer de seu papel tático. Que ele tenha cometido erros bobos com a amarelinha não reduz nada da grandeza desse jogador, mesmo porque olha com quem ele tem que tabelar na seleção.
Reserva: Micah Richards (Manchester City)

3. Dedé (Vasco)
A partida que Dedé fez contra o Universitario do Peru pela Copa Sul-Americana foi uma das melhores atuações em qualquer posição desses últimos seis meses. Catártica, triunfo da garra mas também da técnica e da segurança, coroada com os momentos oportunos para classificar seu time com dois gols e uma assistência. Mas se Dedé está aqui não é por causa de um jogo, mas pela consistência como zagueiro, pelo fenomenal poder de antecipação na cabeça e no pé, e pela capacidade de crescer junto com a temperatura do jogo, algo fundamental do craque, e que separa os bons dos grandes.
Reserva: Thiago Silva (Milan)

4. Mats Hummels (Borussia Dortmund)
Num semestre em que os grandes zagueiros do mundo ficaram boa parte do tempo machucados (Piqué, Vidic) ou foram oscilantes (Terry), coube a Mats Hummels preencher a vaga de melhor zagueiro jogando na Europa. E esse jovem de 23 anos faz jus à deferência, limpando a bola e carregando-a com classe até o meio de campo, espanando de cabeça, sempre muito bem posicionado e também, como Dedé, servindo como medidor de garra de seu clube. No Borussia Dortmund campeão de 2010-2011 Sahin e Götze eram o cérebro e Hummels o coração. Em 2011-2012 falta um pouco do cérebro, mas o coração permanece firme.
Reserva: Holger Badstuber (Bayern de Munique)

6. José Enrique (Liverpool)
José Enrique é nessa lista o único titular que não pode (ainda) ser considerado um grande jogador, mas sua escolha é decorrente da inacreditável seca de laterais-esquerdos de alto nível jogando no futebol mundial. Em todo caso, suas habilidades defensivas e suas subidas cheias de categoria ao ataque o credenciam como o grande lateral da Premier League em seu primeiro turno, e, no desempate com esbaforidos de cabeça quente que precisam levar tática mais a sério (Marcelo) e craques que mostram timidez incompatível com seu talento (Lahm), José Enrique ganha a escolha por ser o mais equilibrado.
Reserva: Philipp Lahm (Bayern de Munique)

5. Gnégnéri Yayá Touré (Manchester City)
Podem dizer que Touré não está jogando de primeiro volante, mas a verdade é que seu posicionamento defensivo no atual Manchester City não mudou tanto assim, e que são seus velozes arranques, garantidos pela presença de mais um volante a seu lado (no caso, Barry), que amplificam a impressão de que Touré ficou “mais ofensivo”. Na verdade o esquema de Mancini apenas abriu espaço para que o marfinense exibisse seu futebol completo com fulminantes subidas ao ataque, que até quando ele corre sozinho parece a invasão de uma esquadra inimiga, e a mesma habilidade no desarme e na antecipação que sabemos de tempos atrás.
Reserva: Alex Song (Arsenal)

8. Bastian Schweinsteiger (Bayern de Munique)
O termo “jogador completo” caiu em vulgata e anda sendo utilizado inapropriadamente, mas seria injustiça abdicar dele para falar de Schweinsteiger. Senhor absoluto do meio de campo do Bayern, ele conduz o time, ele é a respiração, o ritmo, o sangue, o maestro. Um estilo límpido e elegante de tocar a bola e ao mesmo tempo uma energia incansável para se movimentar por todos os lados do campo, atacando, defendendo, cobrando escanteios, faltas etc. sem nunca cantar de galo ou chamar a atenção para si mesmo. Uma contusão séria na clavícula, seguida de operação, fez com que ele não jogasse novembro e dezembro, mas ainda assim sua presença no começo do campeonato foi fundamental para a liderança de seu clube na Bundesliga.
Reserva: Xabi Alonso (Real Madrid)

10. Xavi Hernández (Barcelona)
O que dizer quando seu estilo de jogo forma um time e é a expressão mais perfeita de uma filosofia de jogo, e mesmo assim ninguém no mundo consegue imitar sequer palidamente seu modo de jogar… além de seus próprios companheiros de equipe. O primeiro turno de 2011-2012 mostrou que mesmo com a futura aposentadoria de Xavi o Barcelona terá em Thiago Alcântara e Cesc Fabregas substitutos à altura (ou quase), mas quando o homem volta para assumir sua posição todo mundo se recorda que como ele não tem ninguém. Nem vou mencionar as assustadoras estatísticas de passes certos ou os lances decisivos para não cansar o leitor.
Reserva: Ryan Giggs (Manchester United)

7. Andrés Iniesta (Barcelona)
Iniesta é o equilíbrio perfeito entre a serenidade e o cálculo de Xavi e o ímpeto de Lionel Messi, um meio-campo ofensivo completo que cadencia o jogo quando é necessário e conduz com grande categoria a bola à frente, encontrando ângulos geniais para passe, deslocando-se ou correndo com a bola ou para recebê-la à frente. Outro jogador cujas estatísticas jogo a jogo deixam estupefato. Mas novamente não há nenhuma obrigação de colocá-las aqui. A facilidade de seu toque de bola já é a prova necessária.
Reserva: David Silva (Manchester City)

9. Lionel Messi (Barcelona)
O maior do mundo. De novo. Fácil. Sem necessidade de parágrafo explicativo.
Reserva: Robin Van Persie (Arsenal)

11. Cristiano Ronaldo (Real Madrid)
A inferioridade do Real Madrid ao Barcelona e o pronunciadamente menor poder de fogo em momentos decisivos na comparação com Messi não são o suficiente para retirar de Cristiano Ronaldo a vaga de número 2 no ataque da Meia-lua 2011/2. O atacante português ainda tem um arranque formidável e decisivo, uma enorme capacidade de encontrar seu colega de ataque na cara do gol, sabe limpar uma bola, bater faltas como poucos e é um exímio cabeceador. Não é Messi, mas ninguém pode culpá-lo por isso. Ainda é de longe o segundo jogador mais perigoso do mundo.
Reserva: Neymar (Santos)